Prólogo
Sentada em uma cadeira fria de aço, sentia minha alma vazia. Remexi-me,
percebendo que tanto meus tornozelos quanto pulsos estavam muito bem amarrados.
O desespero dominou meu corpo que antes se encontrava em estado de torpor. O
grito engasgado em minha garganta disputava uma corrida acirrada com o choro
inconsolável.
Onde eu estava? Quem me prendera ali?
Não! NÃO! Aquilo não era real! Era uma visão! Mais uma alucinação. Porém
nenhuma fora tão real. Frio. Pelo meu
conhecimento deveria estar fazendo uns treze graus, mas meu tremor vinha de
outras razões. Um toque suave em meu braço, porém firme. A pessoa não se
atingiu pela minha surpresa.
O grito ganhou vez e saiu de modo horripilante. Os dedos longos
percorreram o caminho da minha clavícula até a mandíbula em milésimos de
segundo. Sentia-me como uma escrava sendo analisada antes de tabelarem um preço
para a venda. Apesar de tudo, nada conseguia sair pela minha boca exceto o
gemido de temor.
- Ele mentiu para mim. Ela ainda vive. Rastreia-a
Passou um segundo antes de voltar a escutar uma voz sussurrando algo que
me parecia um pedido de desculpas. O homem que ordenava fez um barulho estranho
antes de me arrancar da cadeira, retirar a venda e me jogar ao chão. Olhei-o,
mas o ambiente era escuro demais para que conseguisse enxergar mais do que sua
silhueta. Encolhi-me.
- Ora! É isso que me apresentam! Uma criança indefesa!
A mão pesada se chocou contra minha face, derrubando-me ao chão. Comecei
a choramingar, tentando fugir daquela pessoa arrastando-me no chão. Em poucos
passos ele me alcançou, ficando de cócoras e segurando meu pescoço para
levantar minha face. Tive um leve reflexo de seus olhos acinzentados que
formavam duas linhas quase perfeitamente retas em sua face. Era um olhar
psicótico, assassino.
- Eu vou matar você no fim de tudo isso. Entendeu? – Ele estava tirando
vantagem ao ver minha face molhada pelas lágrimas – É uma criança burra e
patética. Tanto quanto toda sua família covarde. No final, toda essa escória
estará morta.
Juntei todas as minhas forças para cuspir na face daquele ser repugnante.
Acertei com contentamento o seu olho. Ele limpou com paciência o líquido
espumoso de sua face antes de me jogar ao chão novamente. O homem chutou minha
barriga e eu senti o gosto de sangue em minha boca. Então ouvi o barulho de
metal, instantaneamente ficando arrepiada – cada nervo meu me dizia para
correr, porém meus músculos não reagiam.
- Vamos começar logo pela vermezinha. – vi o brilho metálico de uma lança
acima de sua cabeça. Uma faca,
concluí alarmada. Então ela desceu...
Sobressaltei-me, acordando daquele sonho completamente sem ar. Minhas
mãos tremiam freneticamente e lágrimas desciam abruptamente pela minha face sem
mesmo que eu me desse conta que estava chorando. Percebi manchas em meu
travesseiro, pelo cheiro eram de sangue. Sabia que o barulho que fazia era grande
demais, mas não pude me controlar devido ao medo. Como consequência minha irmã
acordou.
- Maninha. Você está bem? – fiquei calada tentando me recompor – Enny?
- Sim. – Não. Não poderia estar
pior. As visões precisavam parar. Agora nem meus sonhos eu teria paz. Quanto
mais suportaria viver desconectada com o mundo real? No início elas me diziam
algo que ia acontecer, mas agora... Por que todas elas sempre me mostravam
minha morte? – Só tive um pesadelo. – disse após um tempo.
Minha irmã se levantou da cama, veio até a minha, pediu para eu afastar e
se deitou ao meu lado, segurando minhas mãos – enrolando nossos dedos. Seu
sorriso era doce, reconfortante e parecia afugentar meus medos.
- Não se preocupe. Por pior que seja um pesadelo, você sempre acordará.
- Espero, mana. – falei entre o choro e ela me abraçou ainda mais forte.
Quem diria que em algumas horas aquela frase se tornaria o mantra de uma
nova e perigosa vida na qual eu nem sonharia que poderia acontecer.